Tudo! Nada!

3.6.03

O LUAR:

Eu aprecio o luar, a noite. Acho que seja possível que eu já tenha tido algum caso secreto com ele, que na minha concepção, é bem feminino. Há gente que canta o luar, eu não entendo como. Provavelmente, é algo como arte moderna: não é para entender, é para sentir. Mas até que cantam muito bem...
O luar é o que há de mais ensolarado na noite, que é bela. A lua é o sol das madrugadas. Isso é muito mais bonito do que qualquer manhã de verão, com aquele sol absoluto e nada democrático. A luz da lua é mais discreta, mais serena. Parece que ela tem sabedoria para não incomodar, mas sim agradar a gente. A sinfonia silenciosa da noite transmite mais conhecimento, paz e segurança do que o “astro-rei”, que é impiedoso, e não poupa aqueles que gostam de dormir um pouco mais nas manhãs de domingo. Também pudera, nós é que somos preguiçosos. Somos? Eu sou, e daí? É bom dormir até tarde, acordar na hora que os outros chamam de “errada”! Se o sol descobrir um dia o quanto é bom acordar tarde, ele vai virar um preguiçoso “de carteirinha”, também. O sol ainda não atingiu esse ponto da evolução. Eu digo que a lua é serena, e digo mais: esperta, porque ela sabe disso tudo. Prefere ser pequenina no céu, mas imensa na repercussão que traz sobre o mundo inteiro. Isso é solene. A lua é sábia.
É um deleite imensurável olhar para o universo e saber que somos parte dele. Não, nada de pronomes possessivos; “isso é meu, aquilo é seu”. Somos muito mais que isso, pois somos parte integrante do cosmos. Pode ser que o fim do universo seja meu dedo indicador. Se eu partir do ponto de vista egoístico de que eu sou o começo do universo, posso chegar ao fim dele, depois de dar uma volta, que culminará em mim mesmo. Se você quiser, você também pode se imaginar como o começo do universo. Você é o começo do universo; tudo se inicia em você, e então ocorrem os desdobramentos que dão origem ao cosmos. Tudo então se desenrola. Esse “desenrolar”, é o que conhecemos por realidade. Essa realidade, por sua vez, terminará em você.
Eu queria lembrar também que é ótimo olhar para o céu. Só não aprecio muito olhar para o céu ao meio-dia (hora de Brasília), já que é nesse instante que o sol está logo acima de mim. Gosto dos entardeceres diários, gosto das 17:47h, que são dignas de um texto. O entardecer é o prenúncio da noite, que revela a beleza do luar.
No fundo, esse é um texto bem científico, creio eu, que reflete um pensamento poético. Não houve nada de consultas, nada de doutrina, bibliografia, dogmas, dados recolhidos pelas pesquisas do Ibope, nem similares, para que essa peça fosse produzida. O que se mostra aqui é vida, experiência prática, sentimentos, arte, a explicação do inexplicável. A despreocupação com o mundo técnico e dogmático nos leva a conhecer outros mundos. Não podemos viver num mundo só. Não podemos viver sós no mundo. Temos que nos desprender do mundo bitolado. Temos que dois mais dois é igual a quatro, mas temos que discordar. A lua não se prende a nada, ela é apenas sugestionada pela gravidade. Ela influencia as marés nos oceanos mais profundos, e serve para muitas outras coisas aqui no planeta. A lua é a alma do planeta.
Deixo aqui, minha homenagem ao luar. À lua não, porque a lua é concreta demais para ser homenageada. Eu ficaria sem graça de fazer uma homenagem à lua. Eu e minhas redundâncias, meus pleonasmos que nem sei o que são, minhas figuras desfiguradas de linguagem, minha bagagem esquecida no saguão. Tudo por eu prestar atenção na lua, um louco perdido na rua.

SEM ASSUNTO:

Há certos assuntos que não se encaixam em nenhum tipo de assunto. É o que acontece, por exemplo, quando alguém vai ao teatro e volta para casa discutindo sobre a origem do material do qual é feita a cortina, ao invés de se preocupar com a essência do espetáculo. Uns, provavelmente dirão que um indivíduo que age assim é um chato. Outros o chamarão louco. Não satisfeitos, alguns acreditarão se tratar de um gênio.
Esse texto é sobre isso: assuntos que não são assuntos. Assim acontece quando alguém interrompe a reunião para pedir um copo d’água. Ocorre também nas escolas, quando o professor de história interpreta, inflamado, as frases de efeito ditas por Dom Pedro II em suas proezas sem fim e um aluno lhe interrompe:
“—Posso ir ao banheiro, professor?”
Dom Pedro, a essas alturas, já montou em seu cavalo, e saiu galopando império afora, em busca de um outro pouso, um lugar mais aconchegante, receptivo. Todo o esforço daquele humilde professor fora em vão.
Por quê não fazem a doutrina dos “adoutrinados”? (Ou seja, aqueles que não têm doutrina)! Existem pessoas que vão à aula para ver as outras pessoas. Existem pessoas que vão a um evento simplesmente por ir.
Essas funções são as que fogem do fim específico de um certo agente. Eu estudei isso no direito. Um juiz tem funções fora de seu objetivo de julgar. São funções meramente deliberativas, que servem para “botar ordem na casa”. Exemplo disso, é regulamentar regras de um bom funcionamento de uma secretaria, bem como suas formas de agir diante de determinadas situações. Essas funções fazem o que é funcional funcionar. Quanta redundância. No mundo extra-jurídico, também acontece assim.
Para andarmos de bicicleta, precisamos ter pneus cheios. Mas não é apenas o fato de se ter pneus cheios que fará a bicicleta andar, como mágica. Agora acho que cheguei ao ponto que eu queria: para escrever textos, precisamos ter inspiração, criatividade. Não basta termos os instrumentos necessários à escrita, como o computador, caneta, etc. e sermos alfabetizados. O que eu escreveria se apenas soubesse e pudesse escrever? Eu tenho que querer escrever! E isso faz “brotar” um estado de espírito propício a isso, se a vontade for verdadeira. Tudo na vida será assim. Tudo o que quisermos de verdade, nos será possível.
Ter vontade é o primeiro passo para se concretizar um sonho. Daí surge um trabalho, se a pretensão é sincera. Tudo o que é real se abriga no inconsciente. Não sei se o inconsciente é uma fábrica de ilusões, mas ele é, certamente, um combustível às realizações aparentemente mais difíceis da vida, e torna muitas idéias como fatos concretos nas histórias das pessoas.
Um texto, um estado de espírito, uma conquista material, se forem voluntários, sempre serão “filhos” de idéias que os precederam. As transformações do mundo, a reviravoltas diversas são as “descobertas de novas rodas” a cada dia em que vivemos. Todo dia alguém descobre ou inventa uma nova roda. Ela pode não ser redonda, como a tradicional, conhecida e consagrada por todos nós, mas quem sabe, num futuro, próximo ou mesmo distante, terá utilidade ainda desconhecida por nós.
Não quero discutir o grau de importância das funções “não-principais” das coisas do mundo. Ultimamente nem tenho acreditado muito em medidas, isso é difícil para mim. Apenas quero mostrar para todos, e mostrar a mim mesmo, que as coisas são muito maiores do que parecem ser. Quem sabe a dimensão dos sonhos? Quem sabe as proporções dos pensamentos? Quem me responde essas perguntas? Alguém? Não sei. Às vezes a cortina era mais importante que a própria peça, naquele momento, e eu não soubesse. Talvez ir ao banheiro fosse mais didático naquela hora, do que saber sobre o Dom Pedro. Ou talvez, não! Talvez não! Talvez fosse só um acontecimento para que quem observasse questionasse, ou enlouquecesse mesmo, pensando sobre aquilo. Para que pensar tanto? Não seria muito mais fácil ser um marionete dos deuses? Eu não conseguiria, ou às vezes sou. Vou fazer uma pausa. Profunda. Beber uma “aguazinha”...